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Inserção da juventude no mercado de trabalho é o desafio da década

A juventude mundial apresenta diferentes características de acesso ao mercado de trabalho. Cerca de 71 milhões de jovens estão desempregados e 156 milhões vivem na zona da pobreza – ou seja, mesmo com emprego, eles não recebem o suficiente para sobreviver

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Falar sobre juventude no Brasil é um desafio para qualquer pessoa e organização. Segundo o World Youth Report (Relatório Mundial da Juventude) publicado pela ONU no final de 2018, um dos grandes desafios de se mapear e criar ações bem fundamentadas para jovens em todo o mundo, inclusive no Brasil, é a inconsistência de dados e informações sobre essa parcela significativa da população.

Contudo, um fato transversal em todos os estudos e análises feitas em diversos países é de que não há uma única juventude, mas sim, diferentes juventudes que estão intimamente ligadas à realidade em que nascem e vivem.

Segundo o mesmo relatório da ONU, temos hoje um pouco mais de 1,2 bilhão de jovens (pessoas entre 15 e 24 anos) espalhados por todo o mundo. Isso representa cerca de 16% de toda a população global. De acordo com o Banco Mundial, essa população representa não só uma mudança de paradigmas demográficos, mas, sobretudo, uma grande oportunidade de se acelerar o desenvolvimento econômico, principalmente nos países emergentes.

Entretanto, ao mergulharmos nos desafios dessas juventudes, observamos que cerca de 71 milhões estão desempregados e, ainda mais grave, 156 milhões vivem na zona da pobreza – ou seja, mesmo uma parcela significativa dos jovens que possuem emprego, não recebem o suficiente para se manter. O que era para ser, portanto, um fator de prosperidade social e econômica em diversas nações, é visto como instabilidade política e social – sendo um dos elementos de diversas mobilizações recentes como no Chile e Líbano.

No Brasil a população jovem, de acordo com o IBGE, representa 25% da total população brasileira. Os mesmos fatores que impactam os jovens em outros países, principalmente nos emergentes – tais como falta de acesso à educação de qualidade e oportunidades dignas de emprego -, também são vistos em nosso país. E o nosso desafio começa cedo: em 2015, apenas 38% dos jovens matriculados no Ensino Médio estavam na série correta; sendo que, no mesmo ano, tínhamos apenas 43% dos jovens no Brasil com Ensino Médio completo.

A partir do momento em que o jovem abandona seus estudos, muitas vezes pela necessidade de recorrer a um trabalho informal para sua subsistência e da própria família, aprofundamos em um conceito apresentado pela ONU chamado de desengajamento econômico, ou seja, o momento onde uma parcela representativa da população, deixa de acumular capital humano, fator-chave para aumento da produtividade no país.

Já que grande parte dos incentivos públicos para apoio aos trabalhadores está direcionado à parcela da população que já está no mercado de trabalho e/ou perdeu recentemente seu trabalho, esses jovens ficam, muitas vezes, sem suporte de políticas públicas concretas e falta de abertura do setor privado para ingresso no mercado de trabalho (hoje a maior parte de incentivos para esse momento vem de ONGs). Uma saída apontada nos últimos anos, criada e incentivada, principalmente, pela chamada gig economy, são os trabalhos informais. Esses, ainda sem regulamentação e legislação clara, vêm sendo um dos principais caminhos adotados por jovens para conseguirem fonte de renda.

Além do trabalho informal em si, uma outra saída vista por jovens brasileiros é a possibilidade de empreender seu próprio negócio (seja pelo chamado empreendedorismo de oportunidade ou pela própria necessidade). Atingimos, por exemplo, patamares recordes de abertura de MEIs nos últimos meses no país.

Em um cenário macro de Brasil, onde temos taxa de juros em sua mínima histórica, viés mais liberal na condução de políticas públicas e capacidade produtiva ociosa, se soubermos relacionar esses elementos, teremos condições ímpares de aproveitar o término do bônus demográfico brasileiro que nos resta. Temos como ingredientes para acelerar essa discussão, a tecnologia que configura uma nova forma de se relacionar no mundo do trabalho, bem como a pauta de mais consciência nos negócios – chancelada, inclusive, como uma das mais importantes pautas das gerações Y e Z.

Precisamos, portanto, de um olhar sistêmico para uma pauta que impacta diretamente o presente e futuro dos negócios e do país – afinal, se temos uma grande massa de jovens hoje, esses serão os idosos em um futuro próximo, que sem condições de ingressar no mercado de trabalho e um ambiente previdenciário desfavorável, podem trazer desafios ainda mais profundos.

Como já apontado na agenda 2030 da ONU, especificamente os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável 4 e 8, nosso tempo para reunir Governo, empresas, ONGs e Universidades numa agenda comum para discutir a transição entre escola e trabalho, de forma contemporânea e propositiva chegou e não podemos negligenciar.

Douglas Souza

CEO da Eureca

ESPECIAL PARA O POVO

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